O Brasil tem aproximadamente 2 milhões de pessoas vivendo com Alzheimer e, segundo estimativa do Ministério da Saúde, 100 mil novos casos são diagnosticados por ano. Além dos desafios pessoais que as famílias encontram após o diagnóstico, existem questões práticas a serem enfrentadas: a administração da renda e do patrimônio em favor do parente que adoece.
Comumente, a gestão do dinheiro vai sendo passada aos poucos para uma pessoa próxima – passa-se o cartão do banco, depois a senha; se possível, é providenciado o acesso ao internet banking e/ou aplicativos de celular para que esse terceiro faça o acesso remoto. Não raro, é providenciada uma procuração pública de plenos poderes quando a pessoa acometida pela doença ainda tem condições de assinar frente ao cartorário.
Acontece que, mesmo que feitas de boa-fé, essas práticas são irregulares e podem trazer prejuízos graves para todos os envolvidos.
Primeiro, porque senhas e cartões são pessoais e intransferíveis. Não bastasse, se houver algum problema que demanda a troca de acesso, o que será inviável se a demência estiver avançada, todos os valores a serem geridos estarão bloqueados. Isso sem falar na vulnerabilidade a um número imenso de golpes que são praticados atualmente por meio de aplicativos de mensagens. Dessa maneira, fica praticamente impossível combater esses crimes se cometidos contra uma pessoa cuja conta bancária é administrada irregularmente por outra.
Em segundo lugar, uma procuração de plenos poderes perde os seus efeitos a partir do momento que quem a outorgou está incapaz. Ou seja, a continuidade do uso de uma procuração dada por alguém que já tem os sintomas de Alzheimer instalados é ilegal, ainda que isso seja feito com boas intenções.
É por isso que precisamos falar e orientar sobre a incapacidade jurídica que a doença provoca. A solução adequada para a administração da renda e dos bens de uma pessoa que recebeu o diagnóstico de Alzheimer e cujos sintomas já estão avançados, impedindo que ela mesma seja capaz de gerir seus proventos, é a curatela. Por meio de um processo judicial, no qual ficarão provados o diagnóstico e o grau de incapacidade gerado por ele, o juiz nomeará um ou dois curadores que serão responsáveis pela gestão patrimonial da vida dessa pessoa, sempre em seu benefício. Elas terão o dever de prestar contas ao Poder Judiciário e podem, inclusive, ser remuneradas pelo encargo.
Portanto, a curatela é um instrumento jurídico protetivo das pessoas cuja capacidade foi desafiada por um diagnóstico. Sua autodeterminação, sua dignidade e sua personalidade são mantidos – o que é transferida é a gestão patrimonial. Por isso, não se deve temer a curatela. Ao contrário, essa é a forma legal, transparente e responsável de se cuidar e amparar uma pessoa em vulnerabilidade provocada pelo Alzheimer.
Laura Brito é advogada, professora universitária e fundadora do escritório Laura Brito Advocacia.