Segundo a Ethnologue, considerado o maior inventário de idiomas do mundo, existem mais de 7.000 mil línguas. Destas, dez são conhecidas e utilizadas mundialmente. Por conta disso, muitos pais, de olho no futuro das crianças procuram por alternativas de torná-los fluentes em alguns desses idiomas. No entanto, ainda existem muitas dúvidas acerca do desenvolvimento da fala, da linguagem e da alfabetização das crianças bilíngues. Elas atrapalham ou ajudam no desenvolvimento da fala e linguagem da criança?
De acordo com a fonoaudióloga, doutora em Fonoaudiologia e Especialista em fala e linguagem em crianças, Dra. Camilla Guarnieri, a exposição em dois ou mais idiomas não atrapalha o desenvolvimento da criança, pelo contrário, essa atividade tem reflexos positivos no desenvolvimento de diversas habilidades da criança.
Ao longo da infância, muitos pais preocupados com a confusão entre os idiomas e a dificuldade para se comunicar procuram por especialistas. Entretanto, Camilla afirma que vários estudos já mostram que a exposição a duas ou mais línguas não confunde a criança. A fonoaudióloga explica que da mesma forma que crianças pequenas falantes de uma única língua passam por um processo de desenvolvimento, as multilíngues também passam. Alguns desses processos que são totalmente naturais, podem trazer questionamentos para os pais, como o processo de hipergeneralização, que é quando a criança entende uma regra gramatical de uma língua e a usa para a outra.
Um exemplo de hipergeneralização é usar o termo “limping” para dizer que está limpando. Outro processo que faz parte desse desenvolvimento bilíngue é o code-switching, em que a criança “mistura” as línguas ao falar, dentre outros processos que fazem parte desse modelo de aquisição e desenvolvimento da Fala e da Linguagem. “O ato de dominar todas as habilidades necessárias para falar é extremamente complexo e exige muitas questões como bases cognitivas, estímulo com modelos adequados e treinos. Quando um bebê, por exemplo, é exposto a várias línguas a demanda para ele é grande, por isso, existem processos que simplificam essas demandas para que ele tenha uma comunicação funcional. Mas, se engana quem pensa que isso é prejudicial. Nesse momento da vida, até os 3 anos a janela de oportunidade de aprendizado das crianças é muito grande. Já existem diversos estudos mostrando que essas crianças têm habilidades superiores em diversas habilidades no decorrer desse processo de desenvolvimento”, explica a doutora Camilla.
Outro mito comum é sobre o desenvolvimento da fala. Muitas pessoas acreditam que esse essa exposição pode causar atraso na fala, o que não é verdade. Dificuldades na fala não estão relacionadas ao processo de aprendizagem, são outros fatores mecânicos do organismo que podem causar no atraso da fala. Inclusive, diversas pesquisas comprovam que não é esperado que crianças multilíngues atrasem para começar a falar quando são comparadas às crianças monolíngues.
O multilinguíssimo ainda pode ser uma opção para crianças neurodivergentes, que, a depender do caso, se houver um plano de intervenção (terapia) é bem planejado e alinhado com todos os que estão envolvidos no desenvolvimento da criança, as chances de se obter resultados relevantes e funcionais existem. “Vejo algumas famílias, escolas e profissionais ,excluindo a possibilidade da criança que possui algum tipo de transtorno que atinge a fala e a linguagem excluírem a possibilidade de ter s experiência com o multilinguismo. Sempre explico que precisamos pensar em cada criança e suas individualidades, para entender os benefícios e dificuldades para aquela criança em especifico, mas que em muitos casos o multilinguismo é possível e traz mais benefícios que prejuízos” afirma Camilla Guarnieri.
Por fim, a fonoaudióloga pede cautela. Embora seja positivo, exigir demais da criança pode sobrecarrega-la e inibir comportamentos comuns para a criança. Por isso, Camilla recomenda que toda criança passe por acompanhamento especializado.